Por Jacílio Saraiva | Para o Valor, de São Paulo
Começa a ganhar espaço entre as grandes empresas a oferta de benefícios flexíveis – quando os funcionários escolhem o que querem receber, além do salário. O número de companhias que adere à prática ainda é pequeno no Brasil, mas especialistas do setor de recursos humanos acreditam que esse cenário deve mudar quando a economia ganhar tração e o pleno emprego voltar. A novidade é encarada como uma forma de disseminar a motivação interna e reforçar a marca empregadora das organizações.Pesquisa da consultoria Willis Towers Watson indica que 6% de 1,1 mil empregadores na América Latina, sendo 356 no Brasil, oferecem a alternativa. Do total nacional, 29% dos entrevistados revelam que vão ampliar a variedade dos novos bônus.”Atender os funcionários da melhor forma possível melhora o clima organizacional e traz impactos favoráveis à atração e retenção da força de trabalho, hoje feita de diferentes gerações e estilos de vida”, diz René Ballo, responsável pela área de benefícios da Willis Towers Watson. “São aspectos intangíveis que podem influenciar os resultados das organizações.”No modelo tradicional na área de benefícios, os departamentos de RH estabelecem o que os funcionários podem receber. São itens considerados básicos no mercado de trabalho, como os planos de saúde. Quando adotam prêmios flexíveis, surgem novas opções, como auxílio-creche, descontos em cursos de idiomas, franquia de medicamentos e até em forma de viagem. No Brasil, as regalias mais comuns estão relacionadas à assistência médica, com mais perfis de planos, e apoio a programas de bem-estar, como ingresso em academias e aulas de ginástica.Na Europa, a oferta ficou mais popular porque os empregados podem decidir por ganhar menores salários e mais benefícios, por conta de vantagens tributárias. Nos Estados Unidos, segundo Ballo, já existe uma abordagem mais moderna da cesta de vantagens, que usa um modelo de marketplace, similar às compras on-line, em que o funcionário seleciona as ofertas e os fornecedores de serviços. Geralmente, os aditivos ganham maior repercussão entre equipes mais jovens, na faixa etária de 20 a 30 anos, que valorizam a liberdade de escolha.A farmacêutica Takeda, com 1,2 mil funcionários no país, lançou este ano o programa “My flex”. Cada empregado tem direito a uma determinada quantidade de pontos, de acordo com o pacote escolhido. Os pontos funcionam como “moedas” e podem ser transferidos de um benefício para outro, conforme a necessidade. É possível utilizá-los para solicitar reembolsos de vantagens adicionais, como cursos, compra de óculos e lentes.O foco é atender diferentes perfis e estilos de vida, explica Veronika Falconer, diretora executiva de RH da Takeda para o Brasil e América Latina. “As pessoas querem ser tratadas de forma individualizada. Têm prioridades, valores e demandas familiares diferentes.”A multinacional de origem japonesa ainda incluiu mais recursos de assistência médica e odontológica, opções de estacionamento e cessão de combustível. Também conta com a possibilidade de reembolso para vacinas e terapias. Há mais itens complementares, como assessoria para corridas esportivas, previdência privada e até “vouchers” de aniversário no valor de R$ 200. Todos os funcionários, exceto estagiários e temporários, estão elegíveis às regalias.Para definir os itens do pacote, foram feitas pesquisas internas, com fornecedores e empresas que tocam projetos similares. O movimento, diz Veronika, faz parte de estratégia da Takeda de ser reconhecida como uma empregadora de escolha no mercado de trabalho e uma “best in class” (a melhor da indústria, do inglês), aos olhos dos funcionários.Na multinacional brasileira Stefanini, da área de tecnologia e com 12,5 mil funcionários no país, o lote de auxílios diversificados é intensificado desde 2003 e passou de seis para 12 itens, nos últimos dois anos. “Já estamos preparando a implementação de mais quatro”, revela Cíntia Bortotto, diretora de RH para a América Latina. Do pacote total de benefícios, de 20% a 30% já correspondem às ofertas opcionais.A lista inclui reembolsos para atividades de educação, ônibus fretado e rede de saúde particular. O mais recente a entrar em operação foi o convênio com academias, em que o funcionário se conecta na plataforma do fornecedor e escolhe o plano desejado. Até 2019, devem entrar em vigor o pagamento de viagens e um tíquete “free choice” (escolha livre), que pode ser usado na área de saúde e bem-estar.Segundo Cíntia, do total de funcionários, 60% já aderiram às adições e a estimativa é chegar a 80% do quadro, nos próximos três anos. Uma das principais expectativas é obter melhores resultados de atração e retenção de talentos. “Nossa estratégia passa por aportar mais produtos digitais, o que significa que, provavelmente, o perfil do profissional que contrataremos também será o de quem utiliza esses recursos flexíveis”, diz. A nota no último censo de clima organizacional, em relação aos benefícios, já mostra um aumento de 10%.Na opinião de Mariana Dias Lucon, diretora da Mercer Marsh Benefícios, especializada em gestão de saúde e programas de qualidade de vida e bem-estar, a opção pela livre escolha dos empregados é uma tendência no setor, no longo prazo. De acordo com pesquisa da consultoria com 690 grandes e médios grupos multinacionais e nacionais que empregam 1,7 milhão de pessoas, 12% das organizações têm interesse de implantar benefícios flexíveis nos próximos 12 a 24 meses.”O principal motivo para esse movimento, para 74% das companhias, é a valorização dos seus pacotes de benefícios”, diz. Já entre 71% delas, a atração e retenção de funcionários surgem como os maiores interesses. Mariana afirma que, aos poucos, as diretorias têm percebido que a padronização das ofertas não atende mais tantas necessidades particulares.O estudo da Mercer Marsh, que também mapeou a evolução dos investimentos nos programas de saúde e bem-estar, indica que os valores dispensados na categoria cresceram 21% desde 2015. O total de verba alocado por funcionário, em 2017, foi de R$ 271,21, ante R$ 224,15, há três anos. Trinta e cinco por cento das organizações também incentivam a atividade física, com promoções como grupos de corrida e aulas em academias, enquanto 16% mantêm prerrogativas na área de assistência, como o apoio psicológico.