O Globo – 11 de Março de 2020

Com 35 casos confirmados do novo coronavírus (Sars-CoV-2) no Brasil até ontem, o Ministério da Saúde anunciou que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) editará resolução para que os planos de saúde incluam testes de detecção da doença (Covid-19) no rol de procedimentos de cobertura obrigatória.

Em entrevista coletiva ontem, o secretário- executivo do ministério, João Gabbardo Reis, informou que a resolução deve ser publicada em 48 horas, o que foi confirmado pela AN S.

– Quando isso for contemplado, ninguém poderá ser cobrado, se tiver plano. No momento, não é irregular que haja cobrança – disse.

Procurada, a ANS informou que já há operadoras arcando com o custo do teste. Em reunião realizada ontem na sede da agência, no Rio, com as seguradoras, ficou acertada a inclusão extraordinária do teste no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, que constitui a cobertura mínima obrigatória para os beneficiários de planos.

Segundo a Federação Nacional de Saúde Suplementar, que representa as maiores empresas do setor, as operadoras já estão preparadas para a incorporação do exame na oferta de procedimentos.

A ANS informou também que ainda está detalhando os aspectos técnicos da medida, como o tipo de exame que deverá fazer parte da cobertura obrigatória e as Diretrizes de Utilização, que serão necessárias para adequação aos protocolos do Ministério da Saúde.

O tratamento aos pacientes diagnosticados com a Covid-19, reforçou a ANS, já é assegurado aos beneficiários de planos de saúde, de acordo com o tipo de contrato (ambulatorial, hospitalar).

GOVERNO PAGA INTERNAÇÕES Gabbardo disse ainda que o Ministério da Saúde vai pagar pelas internações decorrentes do novo coronavírus na rede pública, poupando o dinheiro dos estados e municípios.

Ele destacou que, por enquanto, a pasta está conseguindo gastar seus próprios recursos para as ações de combate ao vírus, mas, em algum momento, o ministro Luiz Henrique Mandetta vai ter de negociar com o Congresso uma verba extra.

O ministério também está preparando um protocolo sobre a aplicação do remédio oseltamivir, conhecido pelo nome comercial Tamiflu, nos casos de síndromes gripais, para reduzir as internações hospitalares.

– Esse medicamento vai ter efeito para o novo coronavírus? Não, zero. Vai ter efeito se for influenza? Vai. Vai impedir que tenha a doença? Não. O que faz esse medicamento? Diminui a possibilidade de ter casos graves (de gripe), de internação hospitalar, de óbitos – afirmou Gabbardo.

Os novos casos da Covid-19 registrados no Brasil ontem vieram de Brasília, onde o marido da paciente internada em estado grave também testou positivo, e de São Paulo – que registrou mais três casos, chegando a 19, e é também o estado com mais casos suspeitos: 302 (dos 893 no país).

O Rio de Janeiro estabilizou em oito o número de pacientes confirmados, e o número de diagnósticos em análise caiu para 119.

A Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul já havia confirmado na manhã de ontem o primeiro caso em território gaúcho: um homem de 60 anos que viajou recentemente à Itália, o segundo país mais afetado pela epidemia no mundo, e reside em Campo Bom, na região metropolitana de Porto Alegre. Foi o único estado novo na lista.

O restante dos diagnósticos estão distribuídos por Alagoas (1), Bahia (2), Minas Gerais (1), Espírito Santo (1) e Distrito Federal (2). Apenas três não têm registros de casos suspeitos: Roraima, Amapá e Tocantins.

BRASILEIROS AINDA VIAJAM Nos aeroportos internacionais do Galeão, no Rio, e de Guarulhos, em São Paulo, muitos brasileiros mantiveram ontem os planos de embarcar para Roma, ainda que a Itália seja o epicentro do coronavírus na Europa e esteja em quarentena imposta pelo governo a todo o país.

– A minha família brasileira tem muito medo, mas fazer o quê? Nós temos que trabalhar, pagar as contas. Temos nossos afazeres, não temos como não voltar – afirmou a brasileira Lucelena Costa, de 52 anos, natural de Campo Grande (MS), mas moradora da província de Schiavi di Abruzzo, na Itália.

Após quatro meses no Brasil, ela e o marido italiano, Troiano Enrico, 65, deixaram São Paulo rumo à Roma. Apesar da curva crescente no número de casos, a brasileira se diz ‘tranquila’, já que a família do marido, que também mora na Itália, disse que a situação está sob controle.

– Estou doida para voltar para casa porque a família nos passou tranquilidade. Um pouco é exagero. Em Roma, cidade mais próxima de onde eu moro, não está assim.

Por causa da quarentena, explica, a empresa do marido foi fechada nesta semana e só poderá ser reaberta em 3 de abril, segundo orientações do governo local.

Com um doutorado em metafísica e filosofia programado há quase um ano em Roma, o padre Wilson Lazarotto também deixou Guarulhos com destino àcapital italiana, onde deve passar os próximos dois anos. E não se diz preocupado.

– O que a gente pode fazer a gente faz, mas mais do que isso? Qualquer um pode morrer a qualquer momento. Temos apenas que seguir as precauções.

No Rio, apesar de muitos passageiros tentarem remarcar ou cancelar o voo da Alitalia para Roma, o analista de sistemas Michel Marlon Serrano de Lima, 26, que mora na cidade de Pompeia – a do interior de São Paulo, não a italiana – , manteve a programação das férias. Serão três dias em Roma, depois Paris e Alemanha. Na bagagem, muito álcool em gel e máscaras : – Minha preocupação é que ocorra alguma coisa e eu não consiga sair de Roma. Já pensou ter que ficar em quarentena durante as férias?