O Estado de S. Paulo – 15 de Março de 2020

Planos de saúde se adaptam a pequenos negócios, mas oferta é escassa

O Estadão relata que oferecer benefícios para os funcionários é um investimento importante na vida de uma empresa, e o plano de saúde está entre os mais valorizados. No entanto, micro e pequenos empreendedores costumam reclamar que os preços são de gente grande. Para atrair pequenos negócios – que no ano passado geraram mais vagas de emprego que as grandes empresas no País – operadoras de saúde suplementar, como SulAmérica e Amil, customizaram serviços, ajustando preços e a cobertura de seus planos.

Ainda que os pequenos negócios sejam numerosos – são 5,5 milhões de microempresas e 725,3 mil pequenas, segundo levantamento do Data Sebrae de 2019 -, são poucas as opções. Alguns anos atrás era ainda pior. Em 2015, o empreendedor Eduardo Putz, cofundador da startup gaúcha de big data Connect, teve dificuldade em achar um plano, já que o atendimento das operadoras não levava em conta as especificidades de um pequeno negócio.

‘Era como se eu estivesse contratando um serviço de linha de celular. Eles têm uma tabela, que não sofre variação. Foi super fechada a negociação’, diz ele, que hoje emprega 28 pessoas. O empresário buscou alternativas, como uma startup que trabalha em parceria com a Unimed e oferece serviço de gestão de plano de saúde, a Vitta. ‘Mas saiu mais caro, porque creio que havia a taxa de serviço deles. Então, acabamos contratando a Unimed diretamente’, diz Putz, que fundou a startup ao lado de Rafael Trein.

No caso deles, a Unimed oferece o plano Unimax, pensado para empresas de qualquer porte. Trein diz acreditar que, na condição de empresa que está iniciando atividades, ‘assim como a gente faz esforço para atrair novos clientes, pensamos que essas empresas maiores pudessem oferecer flexibilizações’. ‘Até como incentivo ao empreendedorismo’, completa.

No caso da carioca Vera Lorenzo, diretora executiva da consultoria Fala Idiomas, dentre os 77 funcionários da empresa, 36 recebem o benefício. Para isso, pagam uma coparticipação sobre os custos para usufruir de plano da Bradesco Saúde.

Essa é a segunda operadora contratada pela empresa, que foi fundada em 1997 e só conseguiu contratar um plano de saúde para os funcionários em 2010, com a Unimed. ‘(Com a coparticipação), tem algumas maneiras de você oferecer o benefício sem custar tanto à empresa.’

No que diz respeito à gestão da empresa, o coordenador do Centro de Estudos em Negócios do Insper, David Kallás, destaca a importância de o empreendedor se planejar para adotar o benefício. ‘É necessário ter um pulmão para eventuais sinistralidades, planejar bem e considerar isso no orçamento. Em plano de saúde empresarial, existe a possibilidade de reajuste por causa do sinistro.’

Novidades customizadas para pequenos

Além de pacotes para pessoa jurídica em geral, há quem mire os pequenos negócios de forma específica. A SulAmérica lançou no último mês o Direto PMEzinho, plano com cobertura regional que pode ser contratado por empresas que tenham de 3 até 99 funcionários nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. De acordo com André Lauzana, vice-presidente comercial e marketing da operadora, o novo pacote é 20% mais barato do que os planos nacionais.

‘Uma PME, na maioria dos casos, tem atuação local. Então, pensamos em uma opção mais acessível. Mas também oferecemos o Seguro Viagem nos casos em que o beneficiário necessite viajar por conta do trabalho.’

O PMEzinho é integrado ao programa Cuidado Coordenado, que institui um novo modelo de remuneração da rede credenciada em alguns planos oferecidos pela seguradora. Nesse novo sistema, o pagamento é baseado no desfecho clínico e no atendimento preventivo.

‘A gente convida a rede não só para fazer o atendimento, mas também para fazer a gestão do plano. Dessa forma, os prestadores de serviço passam a ser remunerados pela eficiência do atendimento e a correr os riscos junto conosco’, esclarece Lauzana. A ideia da operadora com isso é evitar procedimentos desnecessários.

No caso da Amil, o pequeno empreendedor pode contratar qualquer um de seus planos, que têm tabela fixa, baseada na média etária dos funcionários. Mas não são levados em consideração fatores como o número de trabalhadores.

A seguradora permite que o cliente empreendedor faça uma composição com coberturas distintas de acordo com a função e as demandas de seus trabalhadores. ‘Há a possibilidade de serviços por hierarquia (do funcionário). Você não precisa oferecer um serviço único para todos os cargos’, explica Carolina Lorenzatto, diretora executiva da Amil.

Na avaliação de Marcos Novais, economista chefe da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), o número expressivo de pequenas empresas aquece o mercado e força as operadoras a adaptarem seus serviços.

‘Estamos passando para um cenário de especialização de pequenas empresas, que atuam em setores específicos. Começa a haver uma demanda, então, de as operadoras entenderem como se relacionar com essas empresas novas.’

Uma das soluções encontradas por associadas da Abramge foi a verticalização empresarial, destaca o economista: ‘Conseguimos colocar todas as empresas, prestadoras de serviço e operadoras, no mesmo objetivo, para servir com o melhor custo-benefício.’

Para Lígia Bahia, professora da UFRJ especialista em saúde pública, apesar do grande número de micro, pequenas e médias empresas, não é seguro falar em tendência de mercado para o setor. ‘É um mercado que depende do crescimento econômico e do aumento da empregabilidade’, pondera. ‘Agora todo trabalhador é MEI. Mas não significa que a maioria desses MEIs tenha condições de contratar um plano de saúde.’

A professora sustenta que o custo per capita da contratação de um plano de saúde ainda é mais alto para quem é pequeno e acrescenta que a saúde financeira desse tipo de empresa costuma ser mais afetada pelas oscilações da economia: ‘Essas empresas são a ponta da cadeia e têm enfrentado dificuldade para se manter em funcionamento.’

De olho na prevenção

Apesar de não apresentarem planos adaptados a pequenos negócios, Porto Seguro, Omint e Bradesco Saúde dizem investir em políticas de reajuste das mensalidades de seus planos, o que tem sido possível com o atendimento preventivo. O novo entendimento é que isso provoque uma diminuição dos custos, já que os tratamentos tendem a ser mais simples quando iniciados o mais breve possível.

Outra medida apontada é a remuneração da rede credenciada baseada no desfecho clínico. O pagamento nesse modelo é tabelado conforme o custo médio que eles têm para os prestadores de serviço. No modelo anterior, a conta era repassada para as operadoras conforme os gastos específicos de cada paciente.

‘Essa é uma forma de reduzir a inflação médica e os custos com procedimentos desnecessários. Assim, nós garantimos maior previsibilidade de custos, o que para o segmento PME é um diferencial’, diz Fábio Daher, diretor da Bradesco Saúde.