Notícias | 2 de dezembro de 2022 | Fonte: G1

O assassinato de um investidor do mercado financeiro de 31 anos em julho de 2021, em Jandira, na Grande São Paulo, virou uma luta jurídica entre a seguradora e a ex-esposa da vítima, mãe de seu filho, para o pagamento da indenização de R$ 66 milhões.

A Prudential do Brasil Seguros de Vida entrou na Justiça paulista em março deste ano, quando ainda havia dúvida se o caso tratava-se de suicídio, o que sustaria o pagamento das apólices. (veja mais abaixo a nota da empresa na íntegra).

A Polícia Civil encerrou o inquérito em 8 de novembro e declarou o caso como homicídio sem autoria conhecida do crime. O Ministério Público irá analisar a investigação e pode pedir apurações complementares. A seguradora se adiantou e também se manifestou, em 21 de novembro, cobrando que pessoas sejam ouvidas, documentos de conhecidos do empresário sejam levantados e exames, realizados.

À época, o investidor foi encontrado baleado na cabeça em seu carro blindado, por volta das 12h30, na Alameda Chile, em Jandira. Agora, cabe ao Ministério Público definir se reabre a investigação ou não.

Somadas, as seis apólices de seguro de vida individual contratadas por José Matheus Silva Gomes totalizam R$ 66.526.675,18.

A ex-esposa chegou a fazer uma reclamação no Procon-SP sobre a falta de pagamentos. Ao g1, o órgão afirmou que o procedimento foi encerrado e que as partes não chegaram a um acordo.

“O consumidor foi orientado a procurar o Judiciário”, afirmou o Procon.

No processo que contesta a indenização, a defesa da Prudential citou que a ação no Procon foi “pressão para receber a indenização securitária que, como visto, é quase um prêmio de loteria”.

As apólices foram contratadas pelo empresário entre setembro de 2019 e janeiro de 2021, segundo apurado pelo g1. Na Justiça, a seguradora citou todas as empresas em que o nome do empresário aparecia como sócio e afirmou, em uma “simples análise” própria, que de 2018 para 2019 o faturamento de uma das empresas teve um aumento de aproximadamente 595%.

“Circunstância essa que gera dúvida razoável quanto à origem desse crescimento, sobretudo considerando todos os demais elementos revelados”, diz a seguradora.


Os advogados da ex-mulher contestaram os pontos levantados pela Prudential como “exploração maldosa” da vítima sobre a suspeita na atividade profissional supostamente ilícita como “falta de base total. Mera pescaria”.

O caso corre pela 2ª Vara Cível de Carapicuíba. O g1 localizou um dos advogados da ex-esposa da vítima. Raphael Blaselbaue afirmou que não comentaria detalhes, mas que a “seguradora se utiliza de estratagema sensacionalista para tumultuar o processo de regulação de sinistro com nítido intuito de negar o pagamento do seguro de vida”.

“A beneficiária e os familiares do segurado sempre se puseram integralmente à disposição das autoridades para auxiliar as investigações. O segurado passou por rigorosa análise da seguradora Prudential, tendo sido o capital segurado de R$ 70 milhões aceito pela seguradora, que recebeu o pagamento de todos os prêmios até a data de sua morte”, disse o advogado.

O empresário também tinha seguro de vida com outras duas seguradoras. Os valores são de cerca de R$ 10 milhões em cada uma delas. As empresas não entraram na Justiça, mas também fazem a análise do caso com o encerramento das investigações pela polícia.

Exumação

Uma outra ação corre pela 6ª Vara Cível de Barueri e discute o pedido de alvará para transferência dos restos mortais do empresário para outro local.

José Matheus foi sepultado no Cemitério Municipal de Carapicuíba. Contudo, os pais tentam levar o corpo para outro cemitério em Alphaville, em Barueri, na Grande São Paulo, para que o túmulo fique próximo da família.

A Prudential também se tornou parte da ação com pedido de produção de prova pericial com “medida indispensável para a correta e completa regulação do sinistro”, disse.

Em outro trecho, a empresa pediu que fosse avisada da exumação para que acompanhe o procedimento e ocorra a coleta de material genético “para verificar se o corpo que foi enterrado no Cemitério Municipal de Carapicuíba corresponde, de fato, ao corpo do Segurado”.

Os pediram foram negados pela Justiça e um recurso ainda será julgado. O corpo permanece onde foi enterrado.

De suicídio a homicídio

De acordo com o relatório final da delegacia de Jandira, as primeiras informações sobre o caso apontavam para um suicídio. A vítima foi encontrada baleada na cabeça, em 2 de julho de 2021, por volta das 12h30, na Alameda Chile.

Policiais militares encontraram José Matheus Silva Gomes deitado no banco traseiro do carro blindado. Ele chegou a ser encaminhado ao Hospital Regional de Osasco, onde foi confirmada a morte. Os órgãos foram doados.

Uma pistola, dinheiro, remédios e cápsulas foram apreendidos e periciados. Uma irmã da vítima informou à polícia que, depois da separação, José Matheus foi morar sozinho em Jandira. O ex-casal mantinha contato e tem um filho que atualmente tem 2 anos.

A irmã esteve com a vítima na noite que antecedeu o crime e não “percebeu problema algum”.

A ex-mulher também foi ouvida pela investigação. Os dois viveram juntos por cerca de quatro anos e tiveram o bebê. O último contato com o empresário foi por mensagens, por volta das 10h do dia do crime.

José era um dos donos de uma empresa de investimentos e tinha outros dois sócios. A vítima era parte majoritária da sociedade, com 60%, sendo que cada um dos demais sócios tem 20%.

A vítima tinha a síndrome do túnel de carpo, o que a deixava com dificuldade para fechar as mãos e carregar objetos, e se recuperava de uma cirurgia de hérnia feita dias antes da morte, conforme o registro do amigo e sócio à polícia.

A Polícia Civil chegou a um guarda civil municipal de Embu das Artes, na Grande São Paulo, como sendo um segurança pessoal da vítima. O homem afirmou que havia três anos que era GCM e fazia a segurança de José de forma esporádica, depois de ser indicado por um conhecido em comum, um militar da Aeronáutica. O segurança soube do crime por telefone, por meio de conhecidos.

Localização

O registro dos policiais militares afirma que eles faziam ronda na área quando viram o carro de José no terreno baldio com as portas fechadas. Ele ainda estava vivo, e o resgate foi chamado. Os PMs usaram um cartão na carteira de José para avisar os conhecidos sobre a situação.

Entre os materiais dentro do carro foi encontrada uma arma, que foi comprada por um comerciante em 2002, vendida a um amigo em 2019 por R$ 3 mil e revendida para uma terceira pessoa. A cadeia de vendas não foi esclarecida, e a venda ilegal será analisada em outro inquérito.

Os investigadores também identificaram um ticket de mercado que poderia ser da vítima, mas as imagens já tinham sido apagadas.

Uma funcionária passou características de dois homens suspeitos que estiveram no estabelecimento. A polícia identificou a dupla. Um dos homens contou que esteve no local para comprar salgados e seguiu com o amigo para um terreno baldio para usarem drogas. Por fotos, ele confirmou que era a mesma área do assassinato do investidor. Citou que viu outros dois rapazes no local, mas não reconheceu como sendo a vítima.

A investigação também ouviu a diarista da vítima, uma das últimas pessoas a ter contato com o empresário. A mulher detalhou que esteve com José Matheus até por volta das 11h30 daquela sexta-feira, quando ele afirmou que “iria ali e já voltava”. Ela chegou a preparar uma sopa e esperar o retorno do morador. Soube da morte apenas na segunda-feira seguinte.

O sigilo telefônico da linha da vítima foi quebrado. O histórico das chamadas efetuadas e recebidas no celular foi analisado, mas não havia pistas do crime.

Não foi possível levantar pela polícia imagens das câmeras de segurança no trajeto entre a casa da vítima e o local do crime.

O Instituto Médico Legal constatou que a morte foi por traumatismo causado por projétil, não havia chamuscamento, mas havia sinal de que o disparo ocorreu com a arma encostada na cabeça. O laudo do Instituto de Criminalística indicou que não havia pólvora nas mãos.

O que diz a Prudential

“A Prudential do Brasil esclarece que, assim que a beneficiária da apólice informou o falecimento do segurado, foi devidamente iniciada a regulação do sinistro. Porém, foram identificadas pendências de documentos não entregues pela beneficiária e relevantes inconsistências. Por essa razão, a empresa ajuizou ação judicial visando, liminarmente, a suspensão da regulação e do pagamento de sinistro para completa averiguação das inconsistências identificadas. Vale ressaltar que a Prudential do Brasil não foi a única seguradora que detinha apólices de seguro de vida contratadas pelo mesmo segurado a adotar essa conduta.

Há decisão vigente da 1ª Vara Cível do Foro de Carapicuíba/SP reafirmando a necessidade de suspensão da regulação desse sinistro até ser proferida sentença dentro do processo, declarando o direito da seguradora à regulação do sinistro. Referida decisão foi recentemente confirmada por decisão colegiada da 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

O pedido de alvará judicial que tramita perante a 6ª Vara Cível da Comarca de Barueri/SP fora apresentado pela própria família do segurado, para que o corpo fosse exumado e trasladado para outro cemitério. A Prudential do Brasil ingressou nesse feito e requereu a realização de perícia para identificação dos restos mortais. Em sentença, foram autorizadas a realização da exumação e a prova pericial. Além disso, o Inquérito Policial segue vigente, havendo diligências pedidas anteriormente pelo Ministério Público ainda pendentes de realização. A Prudential peticionou ressaltando tal pendência, o que está sendo analisado pela Promotoria.

A Prudential do Brasil afirma ainda que, caso as inconsistências identificadas não se materializem concretamente, honrará o compromisso do pagamento do benefício, como tem feito ao longo dos quase 25 anos de atuação no Brasil, já tendo pago mais de R$ 3,4 bilhões de benefícios aos seus clientes. Inclusive, durante a pandemia de Covid-19, esteve ao lado de seus segurados, pagando mais de R$ 300 milhões aos clientes pela doença, apesar da cláusula que excluía pandemias e epidemias dos contratos de seguros de vida.

A companhia trabalha rigorosamente pautada pelos normativos da Superintendência de Seguros Privados (Susep) no que tange à regulação de sinistros e por diretrizes nacionais e internacionais, visando coibir e identificar ocasionais práticas de lavagem de dinheiro e crimes financeiros no mercado de seguros.”