Movimento das operações tem sido intenso na última década, com quase duas centenas de operações.
Valor Econômico – 31 de Maio de 2021
Nos últimos anos, até por uma questão de sobrevivência, as companhias de seguro decidiram romper com o conservadorismo. Foram empurradas para um ambiente de mudanças graças às novas tecnologias capazes de democratizar o seguro, dentro de um novo contexto regulatório, e com a chegada do PIX e transferências por WhatsApp, que possibilitam inúmeros lançamentos ao ter um sistema de pagamento de baixo custo. Neste processo de adaptação, para o qual ainda há um longo caminho a ser percorrido, foi preciso se abrir mais ao mercado.
O avanço das insurtechs escancarou o ativismo do consumidor mais exigente. O novo roteiro estratégico das companhias passou a incluir compra e venda de carteiras e parcerias com diversos agentes do mercado. O movimento de fusões e aquisições tem sido intenso na última década, com quase duas centenas de operações.
O CEO da Porto Seguro, Roberto Santos, não exagera quando diz que “respira” parcerias atualmente. “Nós somos um ecossistema de proteção por meio de uma plataforma de serviços que cria condições para que os corretores possam oferecer uma gama maior de produtos nas variadas linhas”, diz.
Além de acordos com os postos Shell, montadoras e administradoras de cartões, ele menciona a compra neste ano de participação da PetLove por meio da Health for Pet, empresa do grupo que opera planos de saúde para animais de estimação, e da insurtech Segfy, cujo principal produto é a plataforma de gestão e multicálculo, que permite cotações automáticas de seguro. Outro movimento de reposicionamento, visando um foco mais especializado em saúde, envolveu a SulAmérica, cuja carteira de automóveis e ramos elementares passou para as mãos da Allianz.
Outro exemplo é a Icatu Seguros, que fechou várias parcerias. Uma delas com a HDI, para lançar um seguro de vida voltado às PMEs. “Investimos muito em tecnologia e em pessoas, para poder ser a melhor opção para nossos parceiros neste momento que a pandemia acelerou os processos de inovação de vários players”, diz o CEO da Icatu, Luciano Snel.
Segundo ele, a tecnologia embarcada do grupo possibilita infinitos formatos de parcerias, que vão desde um sistema parrudo para atender clientes da Caixa, Itaú e XP até APIs (Interface de Programação de Aplicativos) para plugar no marketplace da Lojas Marisa, onde vende previdência com seguro de vida agregado a partir de R$ 70. “Algumas fintechs começam usando a nossa plataforma e depois criam a própria”, explica.
Um dos cases de sucesso é com o Guiabolso, que tem seis milhões de usuários. A ideia é que ele se torne um marketplace de crédito, cartão de crédito, seguro, previdência e investimentos. As apólices são personalizadas e contratadas pela internet, e o preço da mensalidade começa em R$ 20, num processo de contratação que dura até cinco minutos.
Recém-chegada ao pedaço, a XP Seguros conseguiu crescer no segmento de alta renda e agora busca com as suas parceiras desenvolver produtos para atrair a média renda, como explica o CEO Roberto Teixeira. “A pandemia fomentou o interesse da população por proteções financeiras ligadas a saúde e família. E o seguro de vida tem grande apelo no planejamento familiar”, diz. Neste segmento a XP Seguros já tem como parceiros nomes como Prudential, MAG, MetLife, Omint e Icatu Seguros.
No primeiro semestre deste ano, segundo Teixeira, entram no rol de parceiros mais duas seguradoras e uma insurtech, que viabilizam a contratação e resgate totalmente digital. “Tenho 15 mil apólices vendidas e três milhões de clientes do grupo XP. Temos espaço para um crescimento robusto com parcerias. Conseguimos atrair as melhores seguradoras com produtos diferenciados por termos uma base qualificada, com idade média de 45 anos, e baixa sinistralidade”, diz.
“As oportunidades vêm aumentando significativamente com os bancos digitais, fintechs e marketplaces digitais”, diz Luís Reis, diretor executivo de parcerias da Zurich, seguradora que tem uma joint venture com o Santander, criada em 2011. Segundo ele, além da tecnologia para plugar a plataforma aos sistemas dos parceiros, o grupo suíço tem um portfólio diversificado e uma equipe que pensa em novos produtos 24 horas por dia. “Conseguimos implementar um seguro no parceiro em 15 dias”, afirma.
A lista de clientes inclui nomes como a cooperativa Sicoob, Havan, Casas Bahia, Ponto Frio, Fast Shop e a Amazon, esta última a mais recente. “Quando o cliente da Amazon compra um celular, pode incluir o seguro de proteção para roubo, furtos e danos, de forma totalmente digital”, informa.
A AXA, que foi uma das pioneiras em parcerias com o varejo, agora busca startups, fintechs e bancos digitais. “Lançamos produtos e serviços na nossa base atual de clientes, o que fez crescer nosso faturamento, e conquistamos novos parceiros, que buscam ampliar o leque de produtos agregando o seguro na proteção e fidelização de seus clientes”, afirma Sébastien Guidoni, vice-presidente de parcerias, estratégia e finanças.
Durante a pandemia, o grupo criou uma rede de prestadores para adicionar serviços como telemedicina, com direito a consultas e compra de remédios com descontos. Ainda no primeiro semestre, o grupo estima atingir cem mil apólices do microsseguro com inclusão de doenças graves com serviços de saúde e telemedicina, disponibilizando uma rede nacional com mais de duas mil clínicas, 1,5 mil laboratórios e 12 mil farmácias.
A Liberty Seguros tornou-se a principal parceira do banco Inter. O primeiro contrato foi negociado em 2018 por R$ 12 milhões pelo período de dez anos. “Em 2020, renegociamos por 15 ano, por R$ 368 milhões”, conta Paulo Padilha, CEO da Inter Seguros, cujo banco digital conta com dez milhões de correntistas. Em seguros, o grupo contabilizava 367 mil clientes no primeiro trimestre de 2021, o que mostra o potencial de crescimento na base de clientes. “Temos feito cerca de 70 mil novas vendas por mês, usando um time focado em dados. Acreditamos na oferta contextualizada dos 16 produtos da plataforma, desde pet a previdência.”
A agenda de lançamentos é extensa, com uma plataforma para contratação 100% digital de plano de saúde, com oferta de diversas administradoras, seguro para gadgets, que poderá ser contratado em um clique, e seguro-garantia estendida. “Estudamos abrir produtos para não correntistas, além da operação em outros países”, diz Padilha.
O Sicoob, que tem uma seguradora que atua em vida, optou pela estratégia de realizar parcerias para os seguros de danos com seguradoras do mercado, tendo em vista a necessidade de gerar propostas competitivas para todos os produtos e em todas as regiões do país, conta o diretor comercial e de canais, Francisco Reposse Junior. “Atualmente temos as seguradoras Allianz, HDI, Liberty, Mapfre, Porto, Sompo, Tokio Marine e Zurich. Estas seguradoras atuam com portfólio completo, exceto vida. Temos, ainda, uma parceria específica para o setor do agronegócio, com a Sancor”, diz.
Em 2017, ano em que as primeiras parcerias foram efetivadas, foram comercializados cerca de R$ 380 milhões em prêmios. Já em 2020, a produção do Sicoob ultrapassou a marca de R$ 600 milhões, o que representa um aumento de 57,8% em três anos.
A Mitsui Sumitomo criou uma diretoria para se dedicar às parcerias. A estratégia de diversificação de canal de distribuição, iniciada há quatro anos, teve como foco o canal bancos. “Inicialmente aprofundamos nosso relacionamento com os bancos de montadoras, que já estavam conectados conosco, e entramos no segmento de cooperativas de crédito”, diz o vice-presidente, Helio Kinoshita. A partir de 2019, a seguradora japonesa intensificou a busca por novos parceiros de bancos tradicionais regionais, cooperativas de crédito, bancos digitais e fIntechs. “Criamos produtos de simples contratação, prêmio médio baixo e simples entendimento”, conta Kinoshita.
No primeiro semestre de 2021, em parceria com o banco digital C6, a Mitsui vai lançar um seguro de responsabilidade civil para pequenas construções, que será ofertado nas mais de 1,5 mil lojas deste segmento credenciadas pelo banco digital.
A insurtech Thinkseg inicia em maio a parceria comercial com a Qualicorp, grupo especializado na comercialização e administração de planos de saúde coletivos, que lançou um marketplace de seguro para seus clientes. O Pay Per Use (PPU) será o primeiro seguro auto no portfólio, que já conta com apólices para acidentes pessoais e seguro residencial na plataforma. “É uma relação ‘ganha-ganha’ para os dois lados. O marketplace inovador passa a ter um seguro auto completo com tíquete atrativo”, diz o CEO e fundador da Thinkseg, Andre Gregori. No PPU, o valor do seguro é cobrado de acordo com a quantidade de quilômetros rodados.
O Itaú Unibanco, que tem desde 2009 uma joint venture com a Porto Seguro para seguro de carro e residência, conta atualmente com mais de 15 parceiras para vender seguros, que vão de plano de saúde ao seguro- garantia para grandes contratos. Neste primeiro trimestre, o banco mudou o comando da área de seguros, que responde por 15% do lucro do banco.