Revista Cobertura – Por – 03/09/2022 as 00:28 –
Por Camila Chabar e Lucas Baruzzi
As consequências da mudança climática não são mais novidade para a rotina das empresas. Com o agravamento dessa emergência nos últimos anos, as perdas físicas e financeiras aumentaram significativamente no Brasil e no mundo para quase todos os setores da economia. No setor de seguros, este cenário é ainda mais latente, uma vez que ele é um dos mais afetados pelo aumento da frequência de eventos climáticos extremos.
Relatório publicado pela Swiss Reinsurance Company, maior resseguradora do mundo, revelou que 2020 foi o quinto ano mais caro para o setor em 40 anos. Outro estudo, de autoria do Swiss Re Institute, apontou que, só em 2021, as perdas decorrentes de catástrofes naturais e cobertas pelas seguradoras atingiram US$ 105 bilhões, confirmando um padrão anual de aumento na casa dos 6% nas últimas décadas. Cenários semelhantes foram identificados este ano pelo Environmental Working Group ao avaliar os dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos.
No Brasil, o setor de seguros vem se preparando desde a Rio+20, quando foram criados os Princípios para Sustentabilidade em Seguros, adotados progressivamente por seguradoras brasileiras. Ainda assim, as regulações para a gestão do risco climático vêm se fortalecendo, como é o caso das recentes Resoluções do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
As obrigações da Circular nº 666, publicada em 27 de junho deste ano pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) e em vigor desde 1º de agosto, estabelecem a obrigatoriedade da adoção de instrumentos para gestão dos riscos climáticos, sociais e ambientais e estão em linha com anúncios feitos por órgãos reguladores sobre o reporte de informações não-financeiras. São citadas, por exemplo, a proposta da Securities and Exchange Commission (SEC) dos Estados Unidos e, no Brasil, as normas do BC e da CVM, que trazem exigências de divulgação de informações ESG e de mudança do clima.
Hoje, existe um número crescente de seguradoras e resseguradoras que estão descarbonizando suas carteiras e incorporando os eventos climáticos e transições regulatórias em suas decisões de negócio. Pela norma da Susep, as empresas deverão criar processos e controles para identificar, avaliar, mensurar, tratar, monitorar e reportar os riscos aos quais estão expostas. Para isso, deverão ser adotados três instrumentos específicos: política para gestão dos riscos de sustentabilidade, política de sustentabilidade e relatório de sustentabilidade.
A Circular da Susep definiu os tipos de ameaças que podem afetar o setor segurador e inovou ao trazer os riscos de litígio, que podem ser: i) climáticos, referentes às perdas associadas à mudança do clima, às transições a serem promovidas por regulações supervenientes e à adoção de novas tecnologias e às perdas por litígios; ii) ambientais, relacionados à degradação ambiental; iii) e sociais, referente às perdas por violações aos direitos humanos.
As instituições supervisionadas deverão adotar a gestão dos riscos de sustentabilidade. Para tanto, deverão elaborar um estudo de materialidade e classificar os riscos climáticos, ambientais e sociais identificados conforme sua probabilidade e impacto. Devem ser aplicadas também uma gestão que estabeleça limites de concentração desses riscos, bem como sua precificação e subscrição.
Será necessária, ainda, a adoção de uma política de sustentabilidade elaborada mediante consulta às partes interessadas, aprovada pelo órgão de administração máximo e divulgada ao público externo. Tal política deverá orientar sua oferta de produtos e serviços e ser reavaliada a cada três anos. A Circular da Susep impõe deveres aos órgãos de administração, que deverão assegurar o alinhamento da política de sustentabilidade à instituição, a integração entre as políticas e que o corpo diretivo atue em linha com a política de sustentabilidade e promova as correções necessárias.
As instituições deverão elaborar e divulgar, anualmente, um relatório de sustentabilidade que informe sobre as ações tomadas para gestão dos riscos de sustentabilidade. Sob o ponto de vista da governança, esse documento deverá ser aprovado pelos diretores e ter a ciência dos órgãos de administração, comissões e comitês constituídos.
Por fim, a normativa prevê que a Susep adote tabelas a fim de padronizar a apresentação de informações relativas à gestão dos riscos, tais como principais colaboradores, órgãos e unidades envolvidos na gestão de riscos, seus possíveis impactos no curto, médio e longo prazos sobre o modelo de negócio da instituição e a maneira como os riscos são integrados à Estrutura de Gestão de Riscos (EGR).
* Camila Chabar e Lucas Baruzzi são gerentes da área de Sustentabilidade da EY.