Folha de São Paulo – 27.jul.2023 às 9h12

O Brasil foi a economia que mais cresceu no mundo entre 1950 e 1980. Nessa era desenvolvimentista, o Estado direcionou nossa sofisticação produtiva, enquanto reformavam-se os sistemas tributário, monetário e creditício e as relações do trabalho.

Forças progressistas, como Getúlio VargasJuscelino Kubitschek e Jango, e conservadoras, como a ditadura militar, adotaram o planejamento como ferramenta para superar o subdesenvolvimento: uma economia dual em que setores produtivos coexistem com atrasados e subordinada comercial e tecnologicamente aos países industrializados.

A estratégia de substituir importações diversificou nossa matriz produtiva, mas não eliminou nossa vulnerabilidade externa. Afinal, vastos projetos de infraestrutura, financiados em dólar, não geravam exportações capazes de pagar os empréstimos estrangeiros. Quando o segundo choque do petróleo nos visitou, em 1979, a fragilidade externa se converteu em crise cambial.

A crise da dívida externa, a partir de 1982, sepultou a era desenvolvimentista. A exclusão da América Latina do mercado internacional de crédito colocou a região numa rota de estagnação, hiperinflação e recorrentes crises cambiais. Desde então, o Brasil tenta repetir, sem sucesso, os resultados da era desenvolvimentista se apoiando na abertura comercial e financeira (anos 1990), em políticas sociais combinadas com densos pacotes de estímulos setoriais (anos 2000 até 2014) e, finalmente, no deliberado desmonte do Estado, na precarização do emprego e na especialização regressiva e ambientalmente predatória (governos Temer e Bolsonaro).

Na raiz desse insucesso está a ausência de um sistema nacional integrado de inovação. As iniciativas isoladas bem-sucedidas como a Embraer, a Embrapa, a Petrobras e o BNDES, dentre outras, não foram suficientes para o país manter sua posição no concerto das nações. Esse “miolo ausente” da inovação se associa a um arranjo de política econômica anti-indústria que prende o país ao curto-prazismo agrofinanceiro.

Entender a dinâmica do desenvolvimento não é trivial. Nesse sentido, o livro “Desenvolvimento e Estagnação: O Debate entre Desenvolvimentistas e Liberais Neoclássicos”, de André Nassif (editora Contracorrente), é uma excelente contribuição ao debate público nacional. Nassif apresenta uma leitura teórica atualizada, detalhando o choque das escolas de pensamento sobre o tema da longa estagnação brasileira. Nassif consegue manter o rigor analítico sem carregar no economês, tornando o texto acessível ao público não especializado.

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A visão neoliberal, que domina o debate no Brasil, defende (sem evidências) que o agronegócio nos legará o desenvolvimento, pela graça do livre-comércio e dos fluxos de capital estrangeiro; basta fazermos a nossa “lição de casa” (ajuste fiscal e reformas liberalizantes). Os voos de galinha dos anos 1990 e a estagnação durante Temer-Bolsonaro desautorizam essa recomendação.

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Em contraste, Nassif faz uma defesa fundamentada, teórica e historicamente, da reindustrialização como caminho para o desenvolvimento.

Nassif defende políticas setoriais de sofisticação produtiva, mas aponta que seu sucesso depende da sintonia do regime macroeconômico numa frequência pró-indústria. Em linha com a escola novo-desenvolvimentista de Bresser-Pereira, isso implica, pelo menos, taxa de juros real baixa e taxa de câmbio real competitiva.

Vale destacar, por fim, que “indústria” é uma forma específica de produzir, que autonomiza a inovação tecnológica, gerando melhores empregos e elevando a competitividade internacional das economias. Esse conceito atualizado inclui o próprio agronegócio e os serviços, tais como automação bancária, robótica, inteligência artificial, big data e internet das coisas, dentre outras.

Em suma: não há desenvolvimento sem indústria. O agro pode até ser pop, mas a indústria é top.