Folha de São Paulo – 1º.out.2024 às 4h00 – Cláudia Collucci – São Paulo
A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) está propondo a revisão das regras atuais para incentivar a venda de planos de saúde exclusivamente ambulatoriais, com cobertura para exames e consultas, sem direito à internação.
Também quer rever os critérios de reajustes dos planos individuais e familiares para possibilitar que operadoras façam reajustes excepcionais quando houver desequilíbrio econômico-financeiro em determinado contrato.
É a ANS que aprova, anualmente, o limite de reajustes para os planos individuais e familiares, que representam 17,2% dos 51,1 milhões de consumidores de planos de assistência médica no Brasil. Neste ano, o reajuste máximo foi de 6,91%. Já o aumento médio dos planos coletivos foi de 13,8%.
A agência reguladora pretende discutir ainda mudanças de regras de reajuste de planos coletivos, como aumento do agrupamentos, hoje compostos por contratos com até 29 beneficiários, de forma de diluir riscos e obter reajustes mais equilibrados.
A ideia é trazer também mais transparência aos cálculos dos reajustes. A falta de justificativa no cálculo do reajuste por parte das operadoras de saúde é hoje o principal argumento das decisões judiciais favoráveis ao consumidor nas ações que pedem redução do valor da mensalidade.
Essa e outras propostas foram aprovadas pela diretoria colegiada da ANS na última sexta (27) e serão levadas à audiência pública no próximo dia 7. A decisão é criticada por entidades e pesquisadores da área de defesa do consumidor.
Em nota, o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) informou que considera “completamente inapropriado” discutir na mesma audiência temas complicados e com grande potencial negativo aos consumidores.
O instituto cita como exemplo o reajuste por revisão técnica, que é uma prática vedada pelo Código de Defesa do Consumidor. “Esse tipo de reajuste, a ser implementado quando as empresas passam por dificuldades financeiras, coloca o consumidor numa situação de extrema desvantagem e, na prática, autoriza a alteração unilateral de preço.”
Na avaliação do Idec, seria mais adequado pensar como as operadoras podem aprimorar a gestão das carteiras e em critérios de transparência e compliance para evitar desequilíbrios econômicos-financeiros.
Para o pesquisador da saúde suplementar Mario Scheffer, professor de medicina preventiva da USP Universidade de São Paulo), o local adequado para discutir algo de tamanho impacto, que muda pontos da lei, é o Legislativo, não a ANS.
“Ainda mais nesse momento da agência vulnerável, com um presidente em final de mandato”, diz ele. O mandato de Paulo Rebello, presidente da ANS, termina no dia 21 de dezembro deste ano.
A criação do chamado plano de saúde segmentado ou popular, com cobertura mais restritas e preços mais baratos, já foi tentada pelas operadoras entre 2016 e 2017 mas não vingou devido à forte resistência de entidades de defesa do consumidor e de movimentos da sociedade civil.
A oferta desses planos mais enxutos também foi cogitada em meio ao acordo firmado com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em que elas se comprometeram a suspender as rescisões unilaterais de pacientes em tratamento continuado. Mas isso exigiria alteração na atual proposta de mudança de lei dos planos de saúde, que está na Câmara.
Em comunicado na última sexta, a ANS informou que, inicialmente, a proposta era levar para a sociedade o debate de temas como o aprimoramento de regras relacionadas ao reajuste de planos coletivos, coparticipação e franquia, venda de planos pela internet e a revisão dos planos individuais.
A proposta de inclusão no debate de novas regras para planos exclusivamente ambulatoriais, de acordo com a nota, partiu de Paulo Rebello.
A justificativa é que hoje há cerca de 60 milhões de pessoas usando cartões de descontos, produtos baratos que ofertam consultas e exames, mas sem qualquer tipo de regulação e fiscalização. “É a forma como essas pessoas encontraram de ter acesso aos serviços de saúde”, disse ele.
Pacientes enfrentam problemas com planos de saúde
Veja as propostas de mudanças da ANS
Reajuste de planos coletivos: Ampliar tamanho dos agrupamentos, hoje compostos por contratos com até 29 beneficiários, para maior diluição do risco e obtenção de reajustes mais equilibrados; dar ao consumidor maior transparência sobre o cálculo realizado para a definição do percentual de reajuste.
Coparticipação e franquia: Definição do percentual máximo que poderá ser cobrado por procedimento; definição dos limites financeiros mensal e anual; definição dos procedimentos não elegíveis (sobre os quais não poderá haver cobrança por realização).
Venda online: Obrigatoriedade da venda de planos via internet, a fim de facilitar o acesso dos consumidores a diferentes opções de produtos, de forma rápida.
Revisão técnica de preços de planos individuais/familiares: Estabelecer requisitos para que operadoras possam ter reajustes excepcionais para o conjunto da carteira individual em razão de desequilíbrio econômico-financeiro em determinado contrato.
Planos exclusivamente ambulatoriais: Revisão das regras atuais a fim de incentivar a venda de planos com cobertura para realização de consultas e exames de forma segura para o consumidor.