Estamos em um momento de tragédia humanitária e, provavelmente, diante da maior catástrofe segurada da história, com consequências que ainda não conseguimos mensurar. Por outro lado, apesar da imensa tristeza com as vidas perdidas, no que tange aos bens materiais e aos impactos financeiros e de infraestrutura, nasce a necessidade de fomentar um pouco mais a cultura de seguro em nosso país, visto que o Brasil já tem sofrido os efeitos relacionados às mudanças climáticas com mais frequência e intensidade.
Em 2023, tivermos diversos ciclones bomba na Região Sul, o setor agrícola vem sofrendo com a estiagem excessiva na região Nordeste e, agora, nos deparamos com essa ultra bomba e de uma magnitude tão expressiva, que lamentavelmente deixou 150 cidades debaixo d’água. As perdas serão gigantescas, mas todo esse caos pode levar as autoridades e o mercado segurador para um novo momento, fomentando proteções e aumentando a consciência sobre a importância do seguro, cujo papel social é justamente suportar as perdas materiais e financeiras, ajudando pessoas e negócios a se reerguerem.
Em 2005, o furacão Katrina, um dos mais avassaladores da história dos Estados Unidos, destruiu a região metropolitana de Nova Orleans e trouxe uma perda econômica de U$ 125 bilhões, com a colaboração do setor em quase 60%. Na Venezuela uma inundação, em 2000, gerou uma perda de U$ 3,5 bilhões e o seguro contribuiu 9%. É muito prematuro falarmos sobre o total de perdas no Rio Grande do Sul, mas a previsão de recuperação econômica do estado deve ser em torno de R$ 90 bilhões de reais e, aproximadamente, R$ 9 bilhões e R$15 bilhões arcados pelo mercado segurador.
O Brasil certamente não estará nos moldes americanos, porque a penetração e a consciência de seguro são diferentes aqui e nos Estados Unidos, um mercado maduro e naturalmente catastrófico. Por outro lado, não podemos negar que o país está se tornando mais passível a novos riscos, muitas vezes provocados pelo aquecimento global. Como vivemos um novo momento, precisamos ampliar o nosso alcance e até mesmo o conhecimento de todos sobre os produtos e cláusulas necessárias a diversas apólices e realidades. Conhecer a fundo o risco e suas imensas possibilidades são mais do que um diferencial atualmente, mas uma necessidade.
Enfrentamos outras catástrofes, como a de Petrópolis, que ocorreu recentemente no Rio de Janeiro, mas nunca com um impacto tão intenso em uma zona industrial. O estado do Rio Grande do Sul, a quarta maior potência econômica do país, segundo dados recentes do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), está parado. As chuvas que assolam a região Sul, sem dúvida, impactarão no PIB nacional, resvalando para outros estados.
Como disse, é muito cedo para analisar as perdas, pois elas terão muitas fases e percorrem diversas coberturas de seguro, mas algumas análises são notórias, como o impacto expressivo no maior setor de seguro brasileiro, o de automóvel.
O Agronegócio também terá uma perda máxima muito rápida de ser apurada, com lavouras devastadas, vinícolas com operações paradas, valores gigantescos e diversos desdobramentos. As pequenas e médias empresas devem enfrentar questões complexas, sobretudo as que não possuem cobertura para um alagamento dessa magnitude. Também passamos pela cobertura de lucro cessante, com muitas empresas impactadas, sem escoamento de produção, com fábricas debaixo d’água ou com equipamentos queimados. Analisar o dano financeiro perdido, nestas circunstâncias, se torna mais complexo e moroso. A real extensão dos danos será sentida em meses e, talvez, anos.
A previsibilidade hoje para os eventos climáticos extremos ainda é muito recente, mas o mercado de seguros brasileiro, cabe ressaltar, tem uma alta capacidade para suportar essas tragédias, amparado também pelo resseguro, que reforça a capacidade financeira de cobertura dos sinistros. Por isso, fica a reflexão: como criar mais consciência sobre o segmento, para que se possa, eventualmente, compensar novas perdas e fomentar mais limites de resseguro para eventos catastróficos, potencializando oportunidades de negócios e o apetite em regiões expostas? Talvez tenhamos chegado ao momento de nos debruçarmos sobre este tema, envolvendo na discussão empresários, governantes e a sociedade como um todo.
* Por Luiz Araripe, Country Manager da Gallagher Brasil e CEO Gallagher Re