Apólice – 07 de Agosto de 2020
A judicialização na saúde é uma alternativa para obtenção de medicamento ou tratamento negado por operadoras e seguradoras utilizada pelos usuários. Visando debater o assunto, a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) realizou o webinar “Judicialização no novo normal” ontem, 6 de agosto, com especialistas no tema.
Mediado pela diretora executiva da entidade, Vera Valente, a transmissão ao vivo contou com a participação do desembargador Werson Rêgo, do Tribunal de Justiça do estado do Rio de Janeiro; do juiz de direito Luiz Mário Moutinho, titular da 1º Vara Cível do Recife; e da doutora em direito político e econômico, Angélica Carlini.
Para se ter uma ideia de como o fenômeno da judicialização afeta o setor, um levantamento realizado pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apontou que, entre 2008 e 2017, o número de demandas judiciais relativas à saúde registrou um aumento de 130%. No mesmo período, o total de processos judiciais no país cresceu 50%, o que demonstra como o excesso de ações pode sobrecarregar ainda mais o setor público, privado e até mesmo a própria Justiça.
Durante o evento, os especialistas afirmaram que agentes do judiciário muitas vezes exageram nas suas decisões quando o assunto é saúde. Eles entendem que a judicialização é ocasionada por vários fatores, um deles é a complexidade da Constituição de 1988 e o acesso à justiça facilitado para milhares de pessoas. Segundo Rêgo, isso acaba estimulando o Ativismo Social. “As ações de agentes políticos provocam externalidades no mundo e acabam invadindo a esfera de atribuição de outros. Isso tem um efeito extremamente negativo, pois não se avalia a consequência das decisões no mercado que se pretende intervir”.
Angélica defendeu durante o webinar a criação de varas jurídicas mais eficientes e que tomem suas decisões baseadas em métricas, estabelecendo assim metas a serem cumpridas. Ela disse que organizar Núcleos de Apoio Técnicos (NAT) para auxiliar os magistrados em escolhas mais técnicas pode ser uma solução. “Seriam bancos de dados baseados em evidência para resolver casos mais complexos a partir de um viés científico. Isso seria possível de se fazer com a ajuda das universidades e dos institutos de pesquisa, que agora mais do que nunca estão se mostrando fundamentais para todos nós”.
Moutinho afirmou estar confiante em relação à pandemia da covid-19, pois considera que a quarentena deve tornar os magistrados mais conscientes sobre a importância e as consequências de suas ações. “O novo normal vai dar mais velocidade a algo que já vem ocorrendo: a percepção de que a intervenção judicial deve se dar em termos mais prudentes. Os magistrados, com uma visão mais individual dos litígios, terão que ampliar sua perspectiva para trazer o impacto econômico de sua decisão. Quando vamos para o ambiente de saúde suplementar, a percepção de segurança jurídica, de mais estabilidade e de proteção sistêmica será o futuro do setor”.
Vera acredita que o maior problema de todos é a falta de conhecimento sobre como a saúde suplementar funciona. “Não existe almoço grátis. Se você oferece para um, automaticamente está tirando do outro. Uma decisão que onera muito uma carteira, seja para um indivíduo ou grupo, vai trazer ônus para a carteira inteira e vai expulsar algumas pessoas dos planos de saúde, o que consequentemente vai sobrecarregar o SUS e piorar ainda mais o atendimento à aquela pessoa que está precisando de tratamento”.
De acordo com Moutinho, o juiz não tem que gostar da lei, ele tem que cumpri-la. “Toda vez que um juiz intervém em um regulamento que está claro e decide diferente da lei específica ele está desgovernando. O Estado está agindo com pegadinha com o setor privado”. O desembargador Rêgo ainda disse que a melhor solução é procurar construir consensos entre as partes envolvidas antes mesmo que os casos cheguem ao judiciário. “A busca pelo judiciário é ruim para todos. Às vezes não há comprovação de que há razões para provocar a estrutura estatal”.