CQCS – Notícias | 29 de janeiro de 2025 | Fonte: O Globo
Em mais um capítulo para aprovação do pacote de medidas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) que mudam a política de preços dos planos de saúde, operadoras se manifestaram contra as propostas da reguladora durante audiência pública nesta terça-feira. O projeto inclui itens como a criação de regras para o aumento dos contratos coletivos e limites para cobrança de coparticipação e franquia.
Cesar Sergio Cardim Junior, superintendente de Regulação da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que representa 12 grandes grupos de planos de saúde do país, disse que a tramitação do projeto da ANS acontece “em ritmo acelerado” e que os prazos de cada etapa do processo foram insuficientes para que as operadoras calculassem os impactos das propostas.
O executivo também destacou que faltam dados e estudos técnicos, por parte da ANS, sobre o impacto financeiro e operacional do projeto nas operadoras.
— O tempo é exíguo para que a gente trate de assuntos que são estruturantes, muito relevantes e de muito impacto para a saúde suplementar. Tivemos que realizar estudos técnicos para entender a abrangência das propostas — afirmou.
O combo de medidas foi proposto no início de outubro pela agência reguladora. Depois de passar por audiência pública, a pauta foi aberta para receber contribuições de operadoras, consumidores e instituições da sociedade civil. Em meados de dezembro, os diretores do órgão regulador aprovaram um relatório preliminar com o detalhamento das medidas.
Uma das propostas prevê que a chamada sinistralidade — a fatia da receita da operadora que é usada para custear a assistência médica dos usuários — tenha uma meta mínima de 75%. Para as operadoras, porém, o estabelecimento de um percentual mínimo de receita a ser destinada ao uso em si dos planos não deve acontecer.
— Ao fazer isso, a minuta nos faz entender que há uma desconsideração do perfil dos contratantes, tamanho dos contratos, regras de comissionamento, porte e perfil das operadoras, entre outros pontos — opinou Cardim Junior. — Isso pode atingir o equilíbrio dos contratos, cercear a liberdade das empresas, impactar o modelo de negócios e ocasionar na falta de interesse na oferta de produtos.
Reajuste dos coletivos
Outra proposta trazida pela ANS é a proibição do acúmulo de índices (financeiro e sinistralidade) para o cálculo do reajuste dos planos coletivos. Diferente dos individuais, os planos coletivos não têm um percentual máximo de aumento definido pela ANS, e a correção anual é negociada entre a operadora e a empresa contratante.
— Defendemos a aplicação dos dois índices porque cada um tem uma função específica e mede diferentes aspectos, e a impossibilidade de aplicação de um ou outro implica em desequilíbrio econômico-financeiro — defendeu o representante da FenaSaúde.
A Unimed do Brasil, que representa as 270 Unimeds, argumentou que 169 operadoras brasileiras têm despesas não-assistenciais acima de 25% de suas receitas.
— Ou seja, essas operadoras não conseguiriam sobreviver a essa sinistralidade meta proposta. O sistema de saúde suplementar não existe só nas capitais, mas também no interior, e é formado por empresas de pequeno, médio e grande porte. Esse pacote de mudanças de reajuste dos planos coletivos pode vir a destruir as pequenas e médias operadoras e sobrecarregar o SUS — afirmou o representante da empresa, Daniel Infante.
Coparticipação limitada
Outro ponto previsto pela ANS no pacote de medidas limita a 30% a cobrança de coparticipação por procedimento. O total de coparticipações também não poderia passar de 30% da mensalidade. Pelo projeto, coparticipação e franquia também ficariam proibidas numa lista de procedimentos, principalmente aqueles relacionados a terapias crônicas, oncologia, hemodiálise e alguns exames preventivos.
Atualmente, cerca de 60% do total de beneficiários de planos médico-hospitalares estão em contratos com coparticipação e franquia. No entanto, não há regras que limitam as cobranças pelas operadoras, seja por procedimento ou pelo total de cobranças ao mês.
Segundo Daniele Rodrigues Campos, gerente econômico-financeiro da ANS, há problema na cobrança de valores excessivamente altos e até em medicamentos e materiais ou procedimentos que não deveriam ter cobrança de coparticipação e franquia, como aqueles que não são da escolha do consumidor fazer ou não fazer.
— É importante que se diga que o instrumento de financiamento de plano de saúde é a mensalidade. Onerar o consumidor com coparticipação excessivamente alto pode se tornar financiamento do produto — disse.
Superintendente executivo da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), Marcos Novais argumentou que a proposta praticamente equipararia a cobrança dos planos com coparticipação e franquia aos contratos sem cobranças extras, o que, em sua opinião, pode elevar preços e reduzir o acesso dos beneficiários aos planos de saúde.
— Se a proposta for implementada, o modelo com coparticipação deixa de existir. E isso traz pra gente a questão do impacto no acesso. A própria análise da agência diz que um dos efeitos é o aumento de preço na entrada. Isso tem impacto na inflação e no próprio setor público, porque vai reduzir acesso e aumentar no SUS — afirmou.
Para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), estipular um limite percentual para coparticipação e franquia dificulta a compreensão e o acesso a informação pelos usuários dos planos. O instituto sugeriu que a ANS considere, em vez de percentual, um valor fixo “em patamar módico ao consumidor”.
— A função central desses mecanismos não é o financiamento dos serviços, tampouco a sustentabilidade das carteiras e operadoras. Por isso, eles jamais podem impedir ou encarecer o uso do plano de saúde — observou a advogada Marina Paulleli, do programa de Saúde do Idec.