Revista Apólice – 24 de janeiro de 2022 09:34

O número de avisos de sinistros de seguro rural recebidos pelas seguradoras nas duas últimas semanas de dezembro foi de 10 mil, superando todos os comunicados registrados entre janeiro e novembro de 2021. Com a seca que prejudica soja e milho na região Sul, o valor das perdas em análise ultrapassou R$ 600 milhões na quinzena.

Mais de 80 mil apólices foram comercializadas para esses grãos nesta safra 2021/22, o que mostra que o cenário, que já era difícil sobretudo por causa da quebra da safrinha de milho na temporada 2020/21 e dos efeitos de estiagem, geadas e granizo em cafezais de Minas e São Paulo, tornou-se ainda mais complicado.

Em meados do ano passado, a sinistralidade do seguro rural chegou, em geral, a 200%, e no caso do café o índice superou 300%. No total, as indenizações superaram R$ 4 bilhões de janeiro a novembro, em todo o ano anterior, foram R$ 2,5 bilhões. “A perda foi maior que a contratação. No geral, para cada real contratado de seguro, foram indenizados R$ 2 ou mais. Houve perdas bastante grandes nas seguradoras”, diz Joaquim Neto, presidente da Comissão de Seguro Rural da FenSeg (Federação Nacional de Seguros Gerais).

Na Newe Seguros, 100% das 8,5 mil apólices de seguro rural do inverno passado foram acionadas, e grande parte delas gerou sinistros de mais de R$ 500 mil. “Foi catastrófico”, afirma o vice-presidente da empresa, Rodrigo Motroni. “Foi uma operação de guerra. Tivemos que dobrar o número de peritos para atender aos chamados”.

Diante do movimento de dezembro, a atual safra de verão caminha no mesmo sentido. Até o momento, foram mais de 6 mil acionamentos na Newe, principalmente no Paraná e no Rio Grande do Sul. “Ajustes terão que acontecer ou o mercado não ficará de pé”, alerta Motroni. A expectativa é que os preços dos prêmios aumentem de 10% a 25% já para o seguro do plantio de inverno deste ciclo 2021/22. Os níveis de cobertura segurados nas apólices de produtividade devem cair entre 5% a 15%, projeta o executivo, e algumas regiões podem sofrer restrições. Para o executivo, o mercado mostra “resiliência” ao bancar indenizações bilionárias, mas é preciso novas diretrizes governamentais para diversificar o risco.

De forma geral, especialistas dizem que falta conhecimento do público sobre o seguro rural e mais espaço para atuação em regiões com menor vulnerabilidade climática, como o Centro-Oeste, o que pode equilibrar um pouco mais as contas. Uma ideia recorrente é vincular a obrigatoriedade de contratação de seguro para os empréstimos feitos com subsídios do governo, independentemente da região.

De janeiro a novembro do ano passado, quando as indenizações foram de R$ 4,1 bilhões, o valor arrecadado com prêmios cresceu 42% em relação a igual período de 2020, para R$ 4,7 bilhões.

“O custo do seguro este ano, com certeza, será maior que o de 2021. As seguradoras estão pagando muita indenização e o mercado vai precificar esse risco”, diz Pedro Loyola, diretor do Departamento de Gestão de Riscos do Ministério da Agricultura. O preço final da apólice depende de variáveis como o custo de produção e o valor das commodities, mas a taxa média subiu para 7,6% no ano passado, após duas quedas consecutivas em 2019 e 2020. As taxas do seguro rural variam de 3% a 15%. As 15 seguradoras que atuam no ramo no Brasil garantem cobertura contra 14 eventos climáticos diferentes.

O segmento continua a defender medidas estruturais para assegurar estabilidade para a política de mitigação de riscos, como a criação do Fundo de Amparo ao Sistema de Seguro Rural (FASSR), para garantir recursos em casos de catástrofes climáticas no campo. Demanda antiga, a pauta segue entre as prioridades do Ministério da Agricultura, mas com poucos sinais de que será atendida em tempo de aperto fiscal.

O FASSR substituiria o Fundo de Estabilidade do Seguro Rural (FERS), que ficou caro e caiu em desuso. “Não temos um fundo para catástrofes climáticas. Quando elas ocorrem, seguradoras e resseguradoras arcam com um grande prejuízo e as regiões de maior risco acabam sendo menos atendidas nos anos seguintes”, afirma Loyola.

Para corrigir o problema, diz, é preciso dar uma garantia extra a seguradoras e resseguradoras para momentos de crise e não deixar os produtores rurais desassistidos. “Tem que haver uma supra garantia, que seria oferecida por fundos, para momentos em que ocorrem grandes problemas que levam a uma sinistralidade elevada”.

O Congresso aprovou, em 2010, uma lei complementar que cria o Fundo de Catástrofe, mas a medida nunca foi regulamentada. Na época, estimava-se que o fundo teria que ter cerca de R$ 4 bilhões.

N.F.
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