Revista Apólice – Data de publicação23 de junho de 2023
Pela primeira vez, as seguradoras que operam no Brasil nos dois maiores mercados (cobertura de pessoas e danos e responsabilidades) estão sendo analisadas de acordo com sua atuação na agenda socioambiental. A avaliação está sendo feita pelo RASA (Ranking da Atuação Socioambiental) de instituições financeiras. Elaborado pela SIS (Associação Soluções Inclusivas Sustentáveis), o ranking já avaliou, em dois momentos diferentes, bancos comerciais e instituições financeiras de desenvolvimento.
A inclusão das seguradoras é um processo inédito tanto pelo universo de temas (ambientais, sociais e climáticos), quanto pela profundidade com que são analisadas as atividades de instituições financeiras, começando pelas políticas, que ficam disponíveis publicamente, mas incluindo também todas as etapas relevantes na gestão de riscos de natureza socioambiental e climática em suas atividades, assim como produtos financeiros com impacto ambiental ou social positivo.
O mercado de seguros no Brasil está em uma etapa distinta do mercado bancário com relação à agenda ASG. Nunca houve uma avaliação objetiva e amplamente divulgada desse setor, mas o momento é oportuno para esse tipo de avaliação, já que a Susep (Superintendência de Seguros Privados) publicou, em junho de 2022, uma nova norma (Circular 666) abrangente, exigindo que fatores ambientais, sociais e climáticos sejam considerados nos investimentos e na oferta dos produtos dessas companhias.
O ciclo de avaliação começou em maio e vai até agosto. Serão analisadas as companhias que operam cobrindo riscos relativos a bens e atividades empresariais, de um lado, e cobertura de pessoas (vida, bens e acidentes pessoais), de outro. O mercado de seguros de cobertura de pessoas corresponde a aproximadamente R$ 205 bilhões (valor total dos prêmios recebidos), segundo dados do último ranking da CNseg (Confederação Nacional das Seguradoras), publicado em maio de 2022. O RASA vai analisar as sete maiores seguradoras que, juntas, correspondem a 88,3% desse mercado: BB Seguros, Bradesco Seguros, Caixa Seguros, Zurich Seguros, Itaú Seguros, Icatu e Prudential.
No segmento de danos e responsabilidades, serão analisadas nove das dez maiores seguradoras que, juntas, correspondem a 71,9% de um mercado equivalente a R$105 bilhões. São elas: Porto Seguro, Tokio Marine, Mapfre, Allianz, BB Seguros, Bradesco, Zurich, HDI Talanx e CNP (a Liberty não será incluída por ter sido adquirida pela HDI Talanx). Três delas (BB, Bradesco e Zurich) estão nos dois segmentos. Ao todo, serão analisadas então 13 seguradoras.
Relevância do tema para o setor e para a sociedade
Segundo Luciane Moessa, diretora Executiva e Técnica da SIS, a avaliação, além de pioneira, é importante porque as seguradoras são grandes investidores institucionais. “Desse modo, podem levar em conta fatores ambientais, sociais e climáticos na seleção das empresas em que investem, e também podem fazer isso na estruturação de produtos (seguros), tanto definindo bens e eventos a serem segurados quanto as condições de cobertura de riscos”, explica. O tema tem relevância tanto em termos de prevenção de danos socioambientais e climáticos, quanto em termos de contribuição positiva para uma economia sustentável, inclusive explorando oportunidades de negócios.
“Nada impede que uma seguradora defina, por exemplo, que não vai oferecer seguro por danos ambientais a uma empresa que não possua sequer licença ambiental vigente ou que possua um número muito alto de processos administrativos que podem levar à aplicação de uma penalidade ambiental (da mesma forma que poderia negar seguro ao veículo cujo condutor principal é um motorista que já foi condenado por conduzir embriagado). Isso pode ocorrer, inclusive, de forma não relacionada ao risco, como se uma seguradora decidir não aceitar como clientes empresas incluídas na lista suja do trabalho escravo, por exemplo, ou no Cadastro de Empresas Inidôneas e Suspensas, onde são incluídas as que estão envolvidas em atos de corrupção.”, aponta Luciane.
Do lado das oportunidades, segundo ela, “podem oferecer produtos que visam mitigar riscos ambientais, sociais ou climáticos, tais como o seguro paramétrico, que já é oferecido no Brasil para produtores rurais e é acionado quando chove ou a temperatura sobe acima de certos parâmetros acordados. Fora do Brasil, há experiências inovadoras de grandes seguradoras como Axa e Swiss Re, envolvendo seguro sobre mangues (pela resiliência que proporcionam face a tempestades na zona costeira), seguro sobre recifes de coral (pelo mesmo motivo e também porque atraem turismo nas regiões onde estão presentes, gerando benefícios econômicos) . Esses ativos naturais são prontamente restaurados em caso de desastres climáticos que os destruam, o que também traz benefícios para a biodiversidade marinha.”
As peculiaridades das seguradoras precisam, porém, ser consideradas, e são, já que nem todas as modalidades de seguros permitem a consideração de fatores ambientais, sociais e climáticos (é o caso dos seguros de vida ou de acidentes pessoais). Já para outros, como seguros sobre imóveis (residenciais, comerciais ou industriais), a consideração dos riscos de extremos climáticos, tendo em conta sua localização, é cada vez mais fundamental, inclusive por questões financeiras para as próprias seguradoras.
Metodologia usada
O método usado pelo RASA coleta informações públicas divulgadas nos sites das seguradoras, como Políticas, Relatórios, oferta de produtos, e também outras fontes, como questionários CDP (para as que são signatárias), formulários de referência (apresentados à CVM), questionários ISE (para as que integram o índice de sustentabilidade da B3), relatórios para os Principles for Sustainable Insurance, além de relatórios para o Pacto Global (para as que aderem ao compromisso), nesses dois últimos casos sempre que houver informações separadas para o Brasil. Essas informações são avaliadas à luz de uma metodologia pré-definida (disponível publicamente em www.rasa.org.br), que foi submetida a uma consulta pública em 2022 e recentemente adaptada para o modelo de negócios do setor de seguros.
Depois da fase de coleta, os dados são enviados às seguradoras para que sejam complementados com alguma informação adicional relevante no prazo de três semanas. O ranking final será publicado em agosto.
N.F.
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